A proposta do Partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN) para realizar um referendo sobre a abolição das touradas em Portugal foi rejeitada esta sexta-feira na Assembleia da República. A iniciativa, que pretendia submeter a decisão ao voto popular, foi amplamente debatida, gerando uma intensa troca de argumentos entre as diversas forças políticas, culminando na sua rejeição pela maioria dos partidos.
A proposta contou apenas com o apoio do Bloco de Esquerda (BE) e do Livre, enquanto o Partido Socialista (PS), o Partido Social Democrata (PSD), o Chega, o CDS-PP, a Iniciativa Liberal (IL) e o Partido Comunista Português (PCP) votaram contra. Três deputados do PS optaram por se abster.
Além da proposta de referendo, foram também rejeitadas outras duas iniciativas, uma do PAN e outra do BE, que visavam proibir o acesso de menores de 16 anos a eventos tauromáquicos. Ambas as propostas foram igualmente chumbadas pela maioria parlamentar.
Debate Intenso no Parlamento
O debate sobre o referendo levou a uma acesa discussão entre os deputados, exigindo várias intervenções do presidente da Assembleia da República para moderar o tom das trocas de argumentos. Inês de Sousa Real, líder do PAN, defendeu com veemência a necessidade de dar ao povo a oportunidade de decidir sobre o futuro das touradas no país, frisando o peso financeiro que este setor cultural representa. “Todos os anos, são perto de 20 milhões de euros que insuflam esta atividade, qual balão de oxigénio, que não é dedicado a qualquer outra área cultural”, criticou.
No entanto, o PAN encontrou forte oposição de várias bancadas, nomeadamente do PSD, da Iniciativa Liberal e do Chega. O deputado do PSD, Gonçalo Valente, defensor fervoroso da festa brava, destacou a importância das touradas para a identidade cultural de várias regiões do país, mencionando a sua própria experiência como forcado. “Fui forcado e foram os melhores tempos da minha vida”, declarou, questionando: “Há alguém que consegue imaginar as festas da Moita, de Alcochete, de Vila Franca, de Abiul, de Barrancos, sem a festa brava?”
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Em resposta, Isabel Mendes Lopes, do Livre, afirmou que é possível imaginar festas sem touradas. “É preciso ter pouca imaginação para não conseguir imaginar que as festas podem ser feitas onde não haja tortura, nem sofrimento”, argumentou a deputada, colocando em causa o argumento de que as touradas são uma parte imprescindível das celebrações populares.
A Questão da Decisão Local
Mariana Leitão, da Iniciativa Liberal, defendeu que a decisão sobre a realização ou abolição das touradas deveria ser tomada diretamente pelas populações locais e não no Parlamento. “Não faria mais sentido que as pessoas desses locais decidam diretamente sobre se querem ou não touradas nesses municípios?”, questionou a deputada.
Apesar disso, Inês de Sousa Real reiterou a posição do PAN, frisando que é no Parlamento que se deve decidir o futuro das touradas. “É precisamente nesta Assembleia que se determina a abolição das touradas”, afirmou, acrescentando que o PAN “não teme dar a palavra ao povo português”, acreditando que a maioria está “do lado certo da História, do lado da abolição”.
Acusações de Islamofobia no Debate
O debate tornou-se ainda mais controverso quando o deputado Pedro Frazão, do Chega, desviou a discussão para as práticas de abate de animais em talhos islâmicos, criticando o que considerou serem métodos de abate cruéis utilizados por muçulmanos em Portugal. A intervenção foi imediatamente classificada como “narrativa islamofóbica” por Pedro Delgado Alves, deputado do PS, que criticou o Chega por fomentar divisões com base em preconceitos culturais e religiosos.
As declarações de Pedro Frazão levantaram uma nova frente de discussão no plenário, desviando temporariamente o foco da questão central das touradas para uma discussão sobre práticas religiosas e a proteção dos direitos dos animais em diversos contextos culturais.
Maus-Tratos a Animais: Estatísticas de Condenações
No mesmo dia em que se assinala o Dia do Animal, foram também divulgados dados da Direção-Geral da Política de Justiça, revelando que, nos últimos oito anos, os tribunais portugueses condenaram 562 pessoas por maus-tratos a animais de companhia. Estes números foram destacados pelo PAN no contexto da sua proposta de ampliação da tutela criminal a animais que não sejam apenas os de companhia.
Além disso, o partido propôs a criação de um Plano Nacional de Resgate Animal e a inclusão do resgate de animais nos planos de socorro e proteção civil, sublinhando a necessidade de uma resposta mais estruturada à proteção dos animais no país.
Após um intenso debate que durou várias horas, o Parlamento rejeitou a proposta de referendo para a abolição das touradas.